quinta-feira, 10 de julho de 2014

A Busca


Um pai. Um filho. Uma busca. Só

Todos somos filhos, mas nem todos temos a capacidade de ser pai. Existir é escolher caminhos e, dentre tantos, ter um filho significa se imortalizar. Desde o princípio da história, o homem tenta se imortalizar, seja através da arte ou da relação. Queremos todos deixar a nossa marca nesse milagre extremamente frágil chamado vida. Buscamos incansavelmente nos deixar e acabamos, por fim, deixando nossos filhos. Depositamos neles todos nossos desejos e frustrações e perdemos, a cada minuto, a possibilidade de enxergar a sua individualidade, dom e objetivos. As mães que doam suas vidas para proteger, tentam nos ensinar que, como pais, deveríamos ser fortes o suficiente para ensinar sobre o amor. Amor este perdido na conquista de mais uma.

O filho tem medo e se sente só. O filho fala com o olhar e demonstra toda sua admiração pelo seu pai e o chama, carinhosamente, de “meu super herói”. Anseia ser como ele, possuir como ele, ter certeza como ele, ser forte, pelo simples fato de ser pai. Pobre criança, é filho hoje mas, amanhã, poderá não conseguir ser pai.

Olha pra mim
Vê. Vem. Deixa eu seguir

“A Busca”, dirigido pelo Luciano Moura, não é um filme independente. É um filme solitário. Primeiro porque não há explicação. Não se fala. Mas tudo que está ali foi sentido por seu criador, aposto seriamente nisso. Wagner Moura é o pai (?) e Brás Antunes é o filho (?) – ou vice-versa. Somente os dois interessam, o criador e a criatura. No meio de problemas de relacionamento entre seus pais, Pedro, o filho, resolve fugir. A ideia é atravessar estados para encontrar com o seu avô que, até então, só tinha contato por meio de carta. Ele adota um cavalo e parte em rumo ao seu objetivo: Crescer e ser. A mãe, protetora, grita por um super herói e, como em um passe de mágica, os problemas com o seu ex-marido são deixados de lado para que, assim, possam pensar no que sempre deveriam ter pensado: O filho. O pai segue então em rumo do seu objetivo: Conhecer Pedro.

“Tô” bem aqui

Essa busca por ele mesmo é lindo. O filme se torna um road movie como nunca visto antes. Theo, o pai, conhece o filho dele através das pessoas que o viram passar. Aliás, são muitas pessoas que encontra. Todas acrescentam, encantadoramente, na nossa curiosidade em descobrir onde está o garoto, por que fugiu e o que está fazendo. No final, o filho está se desprendendo das amarras da sociedade, está olhando para o pai e dizendo que nunca o fora de fato e que, agora, está na hora de mostrar quem é e o que está guardado em seu coração. Por isso procura o avô, na sua inocência essa era a única pessoa que o entendia, principalmente pelo fato de também não ter conseguido dar amor ao filho ( pai ). O avô – que é feito pelo maravilhoso Lima Duarte – representa o arrependimento, ou seja, o pai ao final do filme, depois de compreender o seu filho e a sua maturidade/força.

Quando Wagner Moura ( filho ) encontra Lima Duarte ( pai ) – esta cena, inclusive, foi muito esperado pelo Wagner Moura, que é um grande fã do Duarte – ele está sujo, machucado, mas exibe um sorriso no rosto por ter encontrado seu filho. Ele chega antes na casa do seu pai, como se ele fosse o Pedro o filme inteiro. É então que o pai pergunta se ele levou uma surra. Ele prontamente responde: “muitas”. Ele apanhou da vida, do filho mas se manteve de pé para, enfim, se tornar um super herói.

Agora

Há um outro momento que destaco: O pai vê vários jovens sentados na rua, pedindo carona, eles tem a mesma faixa de idade do filho. Ele os leva para uma “festa” com vários jovens. Lá ele encontra uma menina e, então, faz uma pergunta que se torna uma das cenas mais lindas do cinema para mim:

- Estou procurando meu filho.
 - Está cheio de filhos por aqui. – ela responde ironicamente.

Sim. Está cheio de filhos. Filhos da vida. Filhos do cinema. Filhos de um pai e uma mãe. Filhos de avós. Filhos da rua. Filhos que querem ser. Existem filhos assim como existe amor em cada canto. Aliás, filho é a representação humana do amor. O filme é inteligente em usar uma jovem linda e meiga para dizer isso. Repito, mais uma personagem que fala com a voz de Pedro. O fato é que todos os personagens que aparecem ao longo é o mesmo. Seu filho, Pedro. Ele o alerta sobre a sua necessidade, medo e angústia. Fala através de outros personagens.

Eu era, eu era, era, eu sou.

“A Busca” mexeu muito comigo, na minha infância sempre me senti só, sempre precisei de um pai para chamar de super herói, glorificá-lo para os amigos. Não sei, mesmo que você se sinta completo, essa presença masculina faz muita falta. Cresci sendo educado por mulheres, sinto-me feliz por isso, mas o tempo foi passando, o corpo/pensamento mudando e senti muita falta de um pai. Não que o meu não exista, mas ele , assim como muitos e como o filme, nunca conseguiu ser um. Quero acreditar que, algumas pessoas, não tem amor por elas mesmas, são tão perdidas a ponto de perder o crescimento de seus filhos. O que me deixa triste pois, no meu caso, eu tive amor. E quem não tem? Enfim, ás vezes me perco na minha própria inocência em acreditar que as pessoas ferem outras por não ter amor próprio. Inocência é a palavra chave desse filme. A identificação cresce exatamente dela. Da esperança de ser um eterno filho e conseguir ser um bom pai. Escrito por Emerson Teixeira Lima, uma criança que tem lembranças boas do seu pai, principalmente quando ele alugava filmes do Bruce Lee e eles assistiam juntos. Ele, apesar de ser uma pessoa dura, falava como o Bruce lutava bem e ganhava de todos. Enfim, pelo menos ainda me lembro disso.

 Texto dedicado a ele.

 Usei como inspiração a linda música do Arnaldo Antunes “Olha para Mim”. A qual, inclusive, ele gravou com o seu filho, Brás Antunes.

Ps: Texto originalmente postado no "O Cinéfilos: http://supernovo.net/oscinefilos/a-busca-critica/ 

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