quinta-feira, 10 de julho de 2014

Charles Chaplin - Entre as lágrimas e o Sorriso


Sonhador, abusado, explorador, independente, gênio, melancólico, palhaço, amante, mulher, garoto, pobre, rico, mendigo, pedófilo... Por ai vai, por tudo foi. Ao tentar analisar a carreira do grandiosíssimo Sir Charles Spencer Chaplin nos deparamos com a máxima de que "um ponto de vista é a vista de um ponto". Muitos ainda tentam confundir-nos, banalizando a linha tênue e significativa que separa a personalidade da sua criação, sua arte. E, esse homem, que lutou contra todos os outros homens, era um artista, do qual a sua própria genialidade não é digna do mundo do qual ele pisou. O mundo não era - e é - digno de o ter como lar, mas nós somos dignos - devemos ser - de resgatar a mensagem principal que ele nos deixou: Sorrir é o melhor remédio. Mesmo quando o medicamento seja para retardar uma doença incurável.

Incurável é a dor que sinto com seus filmes. Suas obras, seus espetáculos. E realmente são. A atuação é estruturada por duas entidades místicas, conhecidas como: Drama e humor. O que Chaplin faz é elevar o respeito e equilíbrio pelas duas. Nunca as abandonando, nem mesmo quando finge o fazer. Ele era perfeccionista. O seu cinema era perfeito, sabe o motivo? ambos nasceram juntos, portanto o entendia mais do que ninguém.

O cinema começa e, por não existir a voz, a dinamização da nova tecnologia é possível. O mundo inteiro poderia ver uma história sem nenhuma barreira. Como se aquela fosse uma oportunidade real de unificação de ideias, pois, nesse berço, ainda não se pensava em cinema como arte. Entretenimento desconhecido que instigava a curiosidade. Essa etapa do cinema é uma fase tão enigmática que transcende as barreiras da realidade. Cria da fotografia, uma nova forma de exercício intelectual se iniciava, quase que uma teia de desenvolvimentos artísticos. A atuação deveria encaixar nas possibilidades da época, o humor deveria ser ao extremo para segurar a atenção, as histórias tinham que ser curtas. Mas o que raios era aquilo? Qual era o objetivo?

Eu passei longos cinco anos pesquisando o trabalho do Chaplin, não quero aqui ser didático, por mais que em uma outra oportunidade pretendo ser, queria só expor o quanto esse ser humano representou para uma desconhecida oportunidade. Tamanha sua curiosidade, foi desbravando os meios, criando suas piadas - inspirando-se pelas experiências com a mãe e o pai alcoólatra - até que chega um momento do desprendimento, onde esse cara vai fazer a sua obra. Eu fico fascinado com o ataque de oportunismo, o poder desse visionário de dar a cara a tapa para fazer diferente, extrair um conteúdo que já vinha fazendo, mas de uma forma completamente diferente. Ele estava pensando nas pessoas? Ele estava pensando que iria mudar o mundo? Não! Ele queria crescer profissionalmente, mas tudo o que tocava virara flores, pois, como percebemos, Chaplin era dedicado/diferenciado, disposto a entregar um pensamento subversivo sobre o que, realmente, é "sentir". Sua vida não fora anormal até então, menino abandonado pela vida, criado atrás das cortinas dos teatros, esperto, pobre... Ele soube aproveitar um pouco do tudo que passou e criou um pouco de todos que existe no mundo.

Vagabundo


O seu personagem, imortalizado, é extremamente cordial. As adversidades que passa não são sentidas no seu comportamento. Ele não trata diferente, é sempre o mesmo. Delicado, sensível, apaixonado e cavalheiro, um conquistador. Parece estranho, não é? Se sentir apaixonado por um vagabundo. Sua doce arte nos ensina que, ser vagabundo, não o tira a possibilidade de ter esperança nas pessoas. É claro que ele tem muitos envolvimentos com mulheres, mas por que ele desperta o interesse nelas, me parece que tanto homem, quanto as mulheres recebem o mesmo tratamento do nosso querido vagabundo. Ele é um palhaço que vaga, não procurando um lar, procurando compartilhar a sua inocência. Encantando e sendo encantado. Oras com seu humor incomparável, oras com sua tristeza costumeira. Independente, faz-nos amar estar triste para, só assim, sorrir. O sorriso se transforma em conquista árdua, diante a crueldade dos homens que ainda não aprenderam a amar. Chaplin nos diz que um dia irão, não a massa, mas o indivíduo sim. 

A sua roupa demonstra que ele não precisa de muito para ser elegante. Basta um chapéu coco e uma bengala para ser lindo, basta ser, basta o olhar, basta o sorriso tímido ao fim de Luzes da Cidade, basta ser o bastante. O vagabundo é um ícone, uma ideologia. Uma lembrança de que existe muita gente por ai querendo gritar ao mundo que muita coisa está errada. Só de pensar eu fico sufocado. Se uma criança está jogada no meio da rua, o vagabundo olha para cima como se quisesse dizer "Não pode ser, de novo?". Gente, preste atenção no que vou dizer, sinta-me, essa é uma cena de um filme de 1921! Estamos em 2014, situações cada vez piores acontecem e há noventa e três anos atrás um homem gritava por socorro. Através do humor, mas com muito drama, muita verdade.

Um garoto-pai
Caminhando, só, pelas ruas
Se sente infeliz quando olha para o céu
Estão caindo anjos agora? - ele pensa
Anjos com asas quebradas, 
à procura de ajuda da verdade,
Existir e ser pai como deve,
Sem a hipocrisia do nascer,
Buscando no choro a sua canção mais doce.
No cobertor rasgado, a sua melhor proteção.
Não deixe que isso acabe papai,
Um dia fui anjo, 
Hoje te entreguei minhas asas.
Quebraremos vidros da ousadia,
Sentados pelas calçadas perdidas, 
Nas florestas de nossos corações solitários.
Sigamos em frente.

- Escrevi quando tinha 13 anos, logo após assistir "O Garoto" pela primeira vez.


Charles Chaplin está sempre relacionado nas listas infinitas de homens que mudaram a história do mundo, gênios etc. Não vejo muitos conhecendo-o, de fato. Muitos conhecem a sua criação, a figura, mas poucos o nobre senhor por trás dela. Até para ter o mínimo de consciência sobre qual é o limite da sepração entre a vida pessoal e profissional, principalmente relacionando-o com a arte audiovisual, que serve como um apanhado de várias outras artes, trabalhando em conjunto. Estou repetindo tanto sobre a personalidade do Chaplin pois, como se imagina, era muito forte. Essa força para a composição, tanto de músicas como personagens e contextos, surgem de uma pessoa extremamente misteriosa. Um intelectual da entrega, da mulher, sua mãe...


O garoto fala, também, sobre ser pai, então a identificação foi imediata, essa postura dele, esse carinho, mesmo sem ter nada para oferecer ao garoto, sempre me fisgou, de alguma maneiro. Vou até me corrigir, ele tinha muito para oferecer, uma verdadeira boa vida. O tudo do pouco. Comparo a situação social dos seus filmes com a própria felicidade. Você não é feliz, você está feliz. Felicidade não nasce junto com as pessoas, ela vem, mediado por situações de momentos, ela pode, inclusive, acabar no dia seguinte. E é isso, Chaplin, o vagabundo, é indiferente a felicidade, ele renuncia essa benção para nos mostrar que não temos que ser felizes, temos que saber aproveitar a felicidade. E essa mensagem maquiagem nenhuma esconde. 

A vida se torna muito simples com o Charles Chaplin. Qualquer coisa vira piada, dentro do grande drama que contextualiza os seus personagens sem lugar. Mas não pense que não ter lugar é algo ruim, é provado em seus filmes que existe lar em qualquer lugar. Mas o vagabundo não pode parar nos lugares que passa, por mais que doa o coração partir. Ele está sempre em busca de novas oportunidades, novas experiências, para preencher a sua eterna esperança de amar perdidamente. 

A Busca


Um pai. Um filho. Uma busca. Só

Todos somos filhos, mas nem todos temos a capacidade de ser pai. Existir é escolher caminhos e, dentre tantos, ter um filho significa se imortalizar. Desde o princípio da história, o homem tenta se imortalizar, seja através da arte ou da relação. Queremos todos deixar a nossa marca nesse milagre extremamente frágil chamado vida. Buscamos incansavelmente nos deixar e acabamos, por fim, deixando nossos filhos. Depositamos neles todos nossos desejos e frustrações e perdemos, a cada minuto, a possibilidade de enxergar a sua individualidade, dom e objetivos. As mães que doam suas vidas para proteger, tentam nos ensinar que, como pais, deveríamos ser fortes o suficiente para ensinar sobre o amor. Amor este perdido na conquista de mais uma.

O filho tem medo e se sente só. O filho fala com o olhar e demonstra toda sua admiração pelo seu pai e o chama, carinhosamente, de “meu super herói”. Anseia ser como ele, possuir como ele, ter certeza como ele, ser forte, pelo simples fato de ser pai. Pobre criança, é filho hoje mas, amanhã, poderá não conseguir ser pai.

Olha pra mim
Vê. Vem. Deixa eu seguir

“A Busca”, dirigido pelo Luciano Moura, não é um filme independente. É um filme solitário. Primeiro porque não há explicação. Não se fala. Mas tudo que está ali foi sentido por seu criador, aposto seriamente nisso. Wagner Moura é o pai (?) e Brás Antunes é o filho (?) – ou vice-versa. Somente os dois interessam, o criador e a criatura. No meio de problemas de relacionamento entre seus pais, Pedro, o filho, resolve fugir. A ideia é atravessar estados para encontrar com o seu avô que, até então, só tinha contato por meio de carta. Ele adota um cavalo e parte em rumo ao seu objetivo: Crescer e ser. A mãe, protetora, grita por um super herói e, como em um passe de mágica, os problemas com o seu ex-marido são deixados de lado para que, assim, possam pensar no que sempre deveriam ter pensado: O filho. O pai segue então em rumo do seu objetivo: Conhecer Pedro.

“Tô” bem aqui

Essa busca por ele mesmo é lindo. O filme se torna um road movie como nunca visto antes. Theo, o pai, conhece o filho dele através das pessoas que o viram passar. Aliás, são muitas pessoas que encontra. Todas acrescentam, encantadoramente, na nossa curiosidade em descobrir onde está o garoto, por que fugiu e o que está fazendo. No final, o filho está se desprendendo das amarras da sociedade, está olhando para o pai e dizendo que nunca o fora de fato e que, agora, está na hora de mostrar quem é e o que está guardado em seu coração. Por isso procura o avô, na sua inocência essa era a única pessoa que o entendia, principalmente pelo fato de também não ter conseguido dar amor ao filho ( pai ). O avô – que é feito pelo maravilhoso Lima Duarte – representa o arrependimento, ou seja, o pai ao final do filme, depois de compreender o seu filho e a sua maturidade/força.

Quando Wagner Moura ( filho ) encontra Lima Duarte ( pai ) – esta cena, inclusive, foi muito esperado pelo Wagner Moura, que é um grande fã do Duarte – ele está sujo, machucado, mas exibe um sorriso no rosto por ter encontrado seu filho. Ele chega antes na casa do seu pai, como se ele fosse o Pedro o filme inteiro. É então que o pai pergunta se ele levou uma surra. Ele prontamente responde: “muitas”. Ele apanhou da vida, do filho mas se manteve de pé para, enfim, se tornar um super herói.

Agora

Há um outro momento que destaco: O pai vê vários jovens sentados na rua, pedindo carona, eles tem a mesma faixa de idade do filho. Ele os leva para uma “festa” com vários jovens. Lá ele encontra uma menina e, então, faz uma pergunta que se torna uma das cenas mais lindas do cinema para mim:

- Estou procurando meu filho.
 - Está cheio de filhos por aqui. – ela responde ironicamente.

Sim. Está cheio de filhos. Filhos da vida. Filhos do cinema. Filhos de um pai e uma mãe. Filhos de avós. Filhos da rua. Filhos que querem ser. Existem filhos assim como existe amor em cada canto. Aliás, filho é a representação humana do amor. O filme é inteligente em usar uma jovem linda e meiga para dizer isso. Repito, mais uma personagem que fala com a voz de Pedro. O fato é que todos os personagens que aparecem ao longo é o mesmo. Seu filho, Pedro. Ele o alerta sobre a sua necessidade, medo e angústia. Fala através de outros personagens.

Eu era, eu era, era, eu sou.

“A Busca” mexeu muito comigo, na minha infância sempre me senti só, sempre precisei de um pai para chamar de super herói, glorificá-lo para os amigos. Não sei, mesmo que você se sinta completo, essa presença masculina faz muita falta. Cresci sendo educado por mulheres, sinto-me feliz por isso, mas o tempo foi passando, o corpo/pensamento mudando e senti muita falta de um pai. Não que o meu não exista, mas ele , assim como muitos e como o filme, nunca conseguiu ser um. Quero acreditar que, algumas pessoas, não tem amor por elas mesmas, são tão perdidas a ponto de perder o crescimento de seus filhos. O que me deixa triste pois, no meu caso, eu tive amor. E quem não tem? Enfim, ás vezes me perco na minha própria inocência em acreditar que as pessoas ferem outras por não ter amor próprio. Inocência é a palavra chave desse filme. A identificação cresce exatamente dela. Da esperança de ser um eterno filho e conseguir ser um bom pai. Escrito por Emerson Teixeira Lima, uma criança que tem lembranças boas do seu pai, principalmente quando ele alugava filmes do Bruce Lee e eles assistiam juntos. Ele, apesar de ser uma pessoa dura, falava como o Bruce lutava bem e ganhava de todos. Enfim, pelo menos ainda me lembro disso.

 Texto dedicado a ele.

 Usei como inspiração a linda música do Arnaldo Antunes “Olha para Mim”. A qual, inclusive, ele gravou com o seu filho, Brás Antunes.

Ps: Texto originalmente postado no "O Cinéfilos: http://supernovo.net/oscinefilos/a-busca-critica/ 

terça-feira, 8 de julho de 2014

Monstros


Ela é tão linda, doce sentimento efêmero. Causando sufocamento em meu coração, por não saber dizer em palavras o que se passa pela minha cabeça. O olhar abusado, longe de qualquer verdade, faz com que o pobre garoto se sinta abandonado por ser apenas um, dentre tantos. Não que ele seja anormal, simplesmente desconhece a ordem dos fatos, a ordem dos sentimentos, se é que existe alguma, meu caro amigo.

Estava sentado na praça, olhando para as pessoas e me veio a cabeça o quanto elas são superficiais. Seus olhares não demonstram o que são, tampouco o que sentem. Olhares que são, que vão, mas que jamais foram. Olhar cauteloso, inabalável, incontestável, equilibrado e egocêntrico. A vida passa depressa demais, assim como o olhar, que se direciona e se distância mais rápido que um sorriso.

Cavalheiro ressereno, buscando na amada a esperança nela mesma. Guiando-a, tratando-a com carinho e delicadeza. Extrai o seu melhor, para ver o melhor. Se construindo aos poucos, peça por peça, nesse grande quebra cabeça deixado de baixo da cama. Como um bicho papão. Aliás, esse monstro, do qual teimam chamar de papão, se sente infeliz constantemente, pois só queria brincar com a criança, mas ela o teme. Como se fosse de outro mundo, tivesse outras necessidades, como se a aparência transformasse a possível amizade em destruição. Pobre menina, está perdendo o melhor, do melhor monstro.

O palhaço vai descobrindo o seu sepulcro aos poucos, transformando sua vida de fazer rir em fazer chorar. Não que faça alguma diferença, visto que ele sempre foi e sempre será só o palhaço que sempre ajuda mas nunca será ajudado. A dor que ele sente é tão forte que cortou as laterais da sua boca, para rir constantemente, forçando uma origem que se perdeu. Esquecida e irreparável, um homem do riso que um dia se apaixonou platonicamente e, por essa mesma razão, se excluiu, pois viu que a conquista não era para ele, que não tinha coragem de falar para a sua princesa o que ela lhe causava. Um frio na barriga, uma vontade de morder - sem machucar - as suas bochechas rosadas. Há! Como seria bom se ele pudesse colocar um óculos escuro e, como em um passe de mágica, ter coragem para convidar ela para tomar um suco. Mas, pobre palhaço, nem mesmo com sua maquiagem consegue o fazer.

O filho sai de casa, quer morar nas ruas. Para fazer a única coisa que sabe: Cantar. Mas ele não é um exímio cantor, pobre menino, se perdeu em sua própria inocência. Por outro lado suas letras encantam quem passa por ele. Falam constantemente de amor e estar perdido, a procura de compartilhar. Certo dia passa por ele uma jovem, pele branca e cabelos pretos, seus olhos ficaram vidrados e o seu sorriso se mostrou conforme o ritmo doce da composição. Ela se apaixonou, não pelo menino, nem por sua voz, mas pelo que ele tem a dizer. Como se conhecesse aquelas letras, aqueles demônios. Como se soubesse que poderia ajudá-lo. Ela então, em um nobre gesto, roubou a única coisa que o menino tinha: Suas folhas. Fazendo com que não restasse nada. Ele, então, voltou para casa. E ela jamais o esqueceu.

Há uma criança, escondida nas colinas, que nasceu para guiar os homens. Ela ainda não sabe, mas sente constantemente que sua missão é diferente de todos os que conhece. Ela adora ver os pássaros voarem, o som que eles fazem. Ela tem um carinho muito forte, tácito, por alguém que ainda não encontrou. Ela sonhou com ele durante anos, sua forma era distorcida, mas sempre teve certeza que se, por acaso, o encontrasse na rua, o reconheceria imediatamente. Seu amor que ainda não existe, pelo menos não no seu mundo, mas que ela já conhece há muito tempo, como se soubesse que, na vida anterior, ambos foram pássaros que se amaram muito. 

- Emerson Teixeira Lima
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